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Conhecimento do fazer e educação

novembro 24, 2016

Aqui está entrevista minha para meus amigos do Instituto Federal de Santa Catarina. A vídeo foi produzido para subsidiar formação de professores na área de Educação Profissional e Tecnológica. Acho que ficou legal, embora o tempo seja muito para vídeo (mais de vinte minutos).

No dia,eu estava com um baita resfriado, e de vez em quando a garganta raspa denunciando que minha voz poderia falhar…

Se algum amigo conseguir ver esse vídeo, peço a gentileza de fazer seus comentários (favoráveis ou desfavoráveis) aqui.

 

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Memória, aprendizagem e educação

novembro 22, 2016

memoria

Críticas à educação tradicional incluem acusações contra memorização. Isso é uma bobagem. Todo comportamento inteligente depende da memória de fatos, princípios, métodos. A matéria aparecida no Rerum Natura esclarece bem a questão. Para interessados segue link:

O PAPEL DE MEMÓRIA NAS APRENDIZAGENS ESCOLARES

Visão interativa do saber

novembro 10, 2016

Anos atrás, escrevi material para uma curso online, destinado a professores da rede pública do Estado de São Paulo, coordenado pela Fundação Vanzolini. Hoje, ao fuçar nos meus guardados, encontrei o rascunho da primeira unidade de tal curso. Não consegui recuperar as imagens que utilizei na época. Vou ver se elas ainda estão arquivadas em alguma velha pasta. Mas, acho que já posso publicar o texto aqui como uma curiosidade para quem queira saber como organizei meu curso na ocasião.

VISÃO INTERATIVA DO SABER

Muita gente gosta de arranjar rótulos para períodos históricos. Em livros de história são comuns termos como “idade da pedra lascada”, “idade do bronze”, “idade do ferro”, etc. Nos  dias de hoje, são freqüentes as comparações entre Sociedade Industrial – uma era histórica cujos começos aconteceram três séculos atrás – e a Sociedade do Conhecimento – a novíssima era cujos começos aconteceram nos anos oitenta do século XX. Gente de empresa, por exemplo, declara que agora os produtos têm um “valor agregado”. E valor agregado, na nova era, é sobretudo conhecimento.

O uso da expressão Sociedade do Conhecimento está ligado a duas dimensões que nos interessam: informática e educação. Em muitos sentidos diz-se que a Sociedade do Conhecimento é um produto da informática. Computadores cada vez mais poderosos, acessíveis por meio de redes planetárias de comunicação eletrônica, colocam qualquer conhecimento humano ao alcance de todos. Quase tudo que  um cidadão quer ou precisa saber, dizem os entusiastas pela Sociedade do Conhecimento, pode ser obtido de modo imediato. Basta entrar na rede!

Uma das características da nova era é a velocidade de produção. Diz-se que nos últimos trinta ou quarenta anos a humanidade produziu mais conhecimento que todo o período anterior de cem mil anos. Os entusiastas afirmam que o acervo de saber dos humanos irá dobrar em períodos cada vez mais curtos.

A formidável produção de conhecimentos, nos termos relatados até aqui, parece exigir mais educação. Assim, muitos futurólogos deste final de século insistem em dizer que o setor educacional será um grande campo de trabalho nas próximas décadas. O crescimento acelerado da oferta de conhecimento exigirá, de acordo com as visões futuristas, gente mais educada, capaz de fazer bom uso da formidável massa de conhecimentos que estará disponível para quem saiba aproveitá-la. Além disso, dizem as mesmas fontes, a educação deverá sofrer mudanças significativas para acompanhar as demandas da sociedade do futuro. Para exemplificar, cito a seguir trecho de um documento publicado pela Academia Americana de Ciência na WEB. O documento, um belo exemplo de publicação que usa os recursos computacionais disponíveis, chama-se Reiventing Schools: The Technology Is Now [www.nap-edu/readingroom/books/techgap]:

Professores, pais, administradores escolares, e políticos começaram a perceber que é necessário um modelo de educação inteiramente novo. Nesse novo tipo de escola, todos os estudantes irão chegar a altos padrões de aprendizagem porque todas as pessoas deverão estar preparadas para pensar pela vida inteira; todas as pessoas terão de ser capazes de aprender muitas novas habilidades durante o curso de suas vidas. Esse modelo de educação irá aumentar as ligações entre os estudantes e suas comunidades, fazendo com que a escola se envolva  com complexas decisões éticas, técnicas e cívicas que todos os cidadãos terão de fazer. O período e localização da educação será mais flexível para refletir e aproveitar vantagens de mudanças no mercado de trabalho. A distinção entre aprender dentro e fora da escola perderá sentido.

No trecho citado, fala-se de uma nova escola, de uma educação permanente e, sobretudo, de exigências de padrões educacionais muito altos para todos. Além de mudanças nos objetivos, a escola do futuro deverá usar recursos tecnológicos avançados. Deverá aproveitar a fartura de conhecimentos proporcionada pelos novos meios de comunicação. Isso tudo significa mais educação.

CONHECIMENTO OBJETIVADO

Antes de seguir em frente, quero listar algumas características de boa parte dos discursos sobre a nova era. como veremos, mais à frente, tais características são muito importantes em qualquer discussão sobre como fazer educação. É bom notar que o discurso sobre uma Sociedade do Conhecimento, geralmente:

n  não distingue informação de conhecimento

n  não estabelece qualquer critério para avaliar qualidade de conhecimento/

informação

n  vê no conhecimento um produto que pode ser:

> armazenado

> vendido

> comprado

> transmitido

> doado

> controlado por donos ou proprietários

Tais características tem implicações sérias para a educação. A mais séria, no caso, é a implicação de que educar é um ato de transmissão. Não há muita novidade nisso; quase todos os livros de didática descrevem atividade sistemática de ensino como transmissão de conhecimento. Esse modo de ver o trabalho educacional supõe que os conhecimentos tem as características de produto que acabamos de ver.

Pensar o conhecimento com um objeto que independe de agentes do saber e de contextos de significação é uma abordagem que simplifica o entendimento do que é aprendizagem. Essa tendência acaba reforçando a idéia de que aprender é adquirir conhecimento. Na verdade, podemos adquirir informação. Mas o conhecimento só pode ser elaborado por agentes de saber. Essa temática vai merecer um estudo mais extenso na próxima unidade. Por enquanto, eu quero apenas deixar registrado que tratar o conhecimento como um objeto é uma tendência que empobrece nosso modo de ver o processo educacional.

VISÃO INTERACIONISTA

Neste curso, vamos estudar uma proposta à qual tenho dado o nome de abordagem interativa do saber.  Essa abordagem navega contra a corrente. Ao contrário das idéias predominantes, ela está baseada em pontos de vista que:

q não acham que o conhecimento humano está entrando numa fase de crescimento geométrico

q procuram estabelecer uma distinção nítida entre informação e conhecimento

q entendem que o conhecimento é uma  elaboração de sujeitos em atos de aprendizagem

q sabem  que há uma oferta imensa de informações, mas constatam que um número enorme de pessoas é incapaz de converter informação em conhecimento

Não vou expor a abordagem interacionista agora. Vou apenas apresentar um texto para reflexão, tentando mostrar que muita informação não produz, necessariamente, muito conhecimento.

FARTURA DE INFORMAÇÃO

Nosso tempo é uma época de muita fartura de informação. A famosa banca de jornais da Praça Villaboim oferece cerca de quinhentos títulos diferentes de livros, livretos, jornais, revistas etc. E essa oferta já não é tão nova, Caetano Veloso, em música muito conhecida, perguntava no fim dos anos sessenta: “quem lê tanta notícia?” A oferta de fontes de informação na Internet já se conta na casa dos milhões. Acadêmicos, como o professor Donald Norman, recebem em torno de dois mil e-mails por mês.

Tanta fartura é coisa recente na história. No século XIV, por exemplo, como conta S. Tuchman em A Distant Mirror, um rei francês deixou como principal item de herança um bem de preço incalculável: uma biblioteca com três centenas de livros! Hoje, qualquer professor universitário, tem bibliotecas pessoais que ultrapassam em muito a famosa coleção de livros do monarca francês de seiscentos anos atrás.

Há muita informação disponível. E o preço dessa mercadoria vem caindo sistematicamente. Isso não garante que estejamos ficando mais sábios e inteligentes. Sempre que vejo comentários sobre fartura de informação, lembro-me de dois nomes: Aristóteles e Santo Agostinho. Ambos foram gênios e produziram uma obra imensa. Aristóteles viveu a dois mil e quatrocentos anos. Agostinho, a mil e seiscentos. Possivelmente, nem um nem outro tinha biblioteca pessoal equiparável à de um intelectual do século XX. Não dispunham de muita informação. Apesar disso produziram uma obra que continua a ter grande importância para o pensamento de homens que vivem nesta virada de milênio.

Em vez de continuar com nossa conversa sobre conhecimento e informação, faço uma pequena pausa e proponho alguns exercícios, algumas vivências, como dizem os especialistas em treinamento.

INTERPRETAÇÃO DE TEXTO

Exercício/Vivência

Ver informação e conhecimento como sinônimos é uma crença bastante generalizada. Em educação, costumamos pensar que o conhecimento está no texto dos livros. É comum, por exemplo, a expressão “apropriar-se de conhecimentos”. Essa apropriação se faz como um ato de tomada de posse do texto. E, ao fazer isso, o aluno se torna proprietário do conhecimento pois este está contido nas palavras escritas. A crença em foco não é produto de ingenuidade ou ignorância das pessoas. Ela é uma idéia dominante uma vez que as estruturas escolares que conhecemos reforçam a convicção de que o saber pode ser capturado pela linguagem, sobretudo a linguagem escrita.

Para encaminhar uma reflexão sobre as relações entre texto e saber, proponho aqui um exercício. Vou sugerir a leitura de um pequeno escrito dos pesquisadores Bransford e Johnson (1972), citado no livro The Constructive Metaphor (Spivey, 1997). É um trecho curto, sem nenhuma grande dificuldade de estrutura e de vocabulário.

O exercício é simples. Você deve:

n  ler o texto, tentando entendê-lo

n  descrever, em quatro ou cinco palavras, a atividade à qual o texto se refere

n  comparar sua resposta com a resposta fornecida pelos autores

Vamos ao trabalho!

COISAS DA VIDA

O procedimento é muito simples. Em primeiro lugar você separa as coisas em diferentes grupos. É claro que um único monte será suficiente, dependendo da quantidade a ser processada. Ir a outro lugar devido à ausência de equipamento poderá ser o segundo passo; se essa providência for necessária, você estará pronto para continuar. É importante não exagerar na dose. Ou seja, é melhor fazer poucas do que muitas coisas de uma vez. A curto prazo isto pode não parecer importante, mas complicações podem surgir facilmente. Da mesma forma, um erro pode custar caro. No começo, o processo inteiro parecerá complicado. Logo, porém, ele vai se tornar uma outra faceta da vida. É difícil prever qualquer fim para a necessidade dessa tarefa num futuro próximo; mas, quem pode afirmar isso com certeza? Depois que o processo estiver completo, você deve organizar as coisas em diferentes grupos outra vez. A seguir, elas podem ser colocadas em seus lugares. E, quase certamente, serão usadas de novo e um ciclo completo terá de ser repetido. Mas isso faz parte da vida.

Agora que você já leu Coisas da Vida, tente adivinhar a atividade descrita pelo texto. Procure escrever sua adivinhação em poucas palavras.

LIMPAR
resposta
CONFIRMAR

Compare sua solução com o título dado pelos autores do texto, em

(V) resposta deve estar em localização que não permita ao usuário ter acesso à solução do problema antes de registrar sua (dele) tentativa. (V)

RESPOSTA PARA COISAS DA VIDA

§  Como lavar roupas (usando máquina de lavar)

REFLEXÕES SOBRE COISAS DA VIDA

Em experiências realizadas por Bransford e Johnson, os leitores de Coisas da Vida não conseguiam descobrir que o texto referia-se a atividade de lavar roupas. E isso acontecia porque os autores procuraram eliminar palavras que pudessem indicar contexto ao qual o texto se referia. Por essa razão, os leitores não conseguiam dar sentido ao texto.

Entender um texto (uma informação) requer iluminá-lo com conhecimento, dando-lhe sentido. Mas se encontrarmos um texto – fácil ou difícil – ao qual não possamos aplicar nosso conhecimento, é quase impossível o entendimento. Nessa altura acho que é bom citar uma explicação da professora Spivey (1997).

Entender um texto é um processo ativo de construir significado desde os sinais que o escritor fornece. E compor um texto é um processo ativo de construir significado para um texto e usar pistas  textuais para sinalizar significado para os leitores (p. 146)

Não vou falar muito sobre a experiência. Quero apenas insistir nas idéias de que:

n textos passam informação

n informação precisam ser interpretadas

n interpretações são atos de conhecimento

Se você quiser utilizar Coisas da Vida com um grupo de leitores e ver o que acontece, imprima o texto e boa sorte. Antes de seguir em frente, medite um pouco mais sobre Coisas da Vida. Está ficando claro, para você, a necessidade de distinguir claramente informação de conhecimento? Espero que o próximo exercício – SALA DE ESTAR – forneça mais elementos para a distinção que estou propondo. Vamos a ele.

(V) Se possível, usuário deverá poder acessar um cópia limpa de Coisas da Vida para imprimir e usar como sugiro (V)

SALA DE ESTAR

Exercício/Vivência

Vou descrever e fazer alguns comentários sobre SALA DE ESTAR, um exercício que utilizo com referência para discutir relações entre informação e conhecimento em processos educacionais. Se você tiver condições de conseguir voluntários que possam fazer o exercício, suas observações sobre a atividade serão de grande importância para a nossa conversa sobre a questão do conhecimento.

Como Fazer o Exercício

Em SALA DE ESTAR, a dinâmica de trabalho obedece a seguinte seqüência:

1.        os participantes são convidados a trabalhar em duplas num experimento de comunicação;

2.        nas duplas de trabalho, cada participante senta-se com as costas voltadas para as costas do respectivo parceiro;

3.        um dos componentes da dupla recebe o original de SALA DE ESTAR; o outro componente, uma folha de sulfite em branco;

4.        o componente que receber a figura original exercerá o papel de instrutor/professor; seu parceiro exercerá o papel de aluno/treinando;

5.        em hipótese alguma, o aluno poderá ver a figura em poder do professor;

6.        o professor deverá passar oralmente instruções que ajudem o aluno a desenhar SALA DE ESTAR, reproduzindo com a maior fidelidade possível a figura original;

7.        o trabalho das duplas devera durar de quinze a vinte minutos;

8.        terminado o trabalho de instrução e reprodução, as duplas discutirão a experiência por um cinco minutos.

Como disse, você poderá fazer essa experiência com alguns voluntários para verificar o que acontece. Além da dinâmica das relações entre professor e aluno em cada dupla, o que mais nos interessa aqui é o que o aluno produz a partir das instruções do professor.

Se você quiser fazer a experiência será preciso obter uma cópia do original de SALA DE ESTAR. Para obter sua cópia clique em original e imprima a página com a famosa figura.

(V) Será preciso garantir a possibilidade de acesso a uma página inteira com a figura original de sala de estar, pois assim o participante poderá imprimi-la para uso em experimentos que possa fazer (V)

Tenha você feito ou não a experiência proposta, convém ler os comentários que seguem:

Minhas Intenções com SALA DE ESTAR

Ao trabalhar com SALA DE ESTAR, procuro criar uma analogia que pode nos ajudar a pensar sobre as relações entre informação e conhecimento. Mas antes de falar sobre as relações que podem ser vivenciadas no exercício, quero explicar o significado dos elementos que integram SALA DE ESTAR.

n Desenho original: representa o conhecimento do professor.

n Instrução criada pelo professor: é informação produzida a partir de um determinado campo de conhecimento; na escola, damos a isso o nome de ensino.

n Posição dos pares – costa/costa: simula a impossibilidade do aluno ter acesso direto ao conhecimento do professor; simula também a impossibilidade do professor ter acesso direto ao conhecimento do aluno.

n Desenho produzido pelo aluno: representa o conhecimento elaborado pelo aluno a partir das instruções passadas pelo professor.

Minha principal intenção com SALA DE ESTAR é a de mostrar a diferença entre conhecimento (original) do professor e conhecimento elaborado pelo aluno. Além disso, é provável que já comece a ficar evidenciada a diferença entre informação e conhecimento, tema que pretendo discutir mais à frente neste curso.

Quem conseguiu fazer o exercício deve ter obtido figuras muito interessantes produzidas pelos alunos. Para nossa reflexão comum, mostro a seguir dois trabalhos elaborados por alunos num dos meus “experimentos”.

Figura original de SALA DE ESTAR

 

SALA DE ESTAR: Produção de Aluno A/2000

SALA DE ESTAR: Produção de aluno B/2000

Como a gente pode verificar, a distância entre a figura original e produções dos alunos é muito grande. Como explicar isso em termos das relações entre conhecimento do professor, informação ou ensino, e conhecimento produzido pelo aluno? Para responder essa questão de modo mais sistemático, vamos a nosso primeiro diagnóstico de aprendizagem.

DIAGNÓSTICO DE APRENDIZAGEM

Ao chegar até aqui, você deve ter lido meu texto e examinado dois exercícios (Coisas de Vida e Sala de Estar). Acho que já temos elementos para estabelecer uma visão compartilhada de entendimento sobre dois termos muito importantes, informação e conhecimento. E vamos fazer isso usando o Diagnóstico de Aprendizagem.

Não vou propor um exercício para saber se você domina o conteúdo. Vou, muito mais, sugerir uma atividade que possa servir de registro para os resultados de usa reflexões sobre o texto de leitura e os dois exercícios que integram essa unidade. Como SALA DE ESTAR é, a meu ver, um exercício muito rico, vou utilizá-lo como objeto de nossa conversa final nesta unidade.

ATIVIDADE

  • Como você pode verificar no exercício SALA DE ESTAR, há uma diferença muito acentuada entre conhecimento do professor e conhecimento elaborado pelo aluno. Considere a situação e escreva um pequeno ensaio (cerca de vinte linhas) sobre os porquês da diferença. Tente, em seu texto, definir o que é informação e o que é conhecimento. Quando terminar seu escrito compare o resultado de seu trabalho com o gabarito que criei.

Compare sua resposta com o gabarito

Há uma diferença acentuada entre conhecimento do professor e conhecimento do aluno. Como explicá-la?

Acho que uma boa resposta deve considerar:

1.    O conhecimento das pessoas não é diretamente acessível. Apenas o sujeito conhecedor tem visão clara e total daquilo que ele sabe. Nesse sentido, o conhecimento é subjetivo.

2.    Para tornar o conhecimento pessoal acessível, as pessoas produzem informação. Esta última é constituída por representações externas às quais conferimos significado. Quando duas ou mais pessoas se põem de acordo quanto ao significado de um item de informação (um símbolo, uma palavra, uma figura etc.) ocorre comunicação (algo conhecido é colocado em comum).

3.    Para produzir seu conhecimento, o aluno em SALA DE ESTAR conta com duas coisas: informação do professor e conhecimento prévio ou anterior. Ele interpreta as informações que recebe de acordo com seu entendimento (sua estrutura de conhecimento já constituída).

4.    Nem sempre as interpretações do aluno caminham na direção esperada pelo professor.

5.    Provavelmente, sempre haverá certa diferença entre conhecimento do professor e conhecimento elaborado pelo aluno.

6.    Parte do problema comunicativo em SALA DE ESTAR deve-se à falta de cuidado do professor na produção de informações. Muitas vezes os professores, na produção de informações, não consideram o ponto de vista dos alunos. Ao fazerem isso, geram informação que não comunica ou leva o aluno a interpretações não esperadas.

Fala na Constituinte

novembro 4, 2016

Na época da Assembleia Nacional Constituinte, eu fazia parte do Fórum Nacional de Educação. Numa das audiências públicas falei sobre educação de adultos. O tempo foi insuficiente. Florestan Fernandes, na época deputado constituinte, me cedeu o tempo dele para que eu concluísse minha comunicação (essa é uma das memórias emocionantes de minha vida, pois a iniciativa de me conceder mais tempo foi do grande intelectual brasileiro).

Copio aqui o programa da Subcomissão de Educação para o dia 23/04/1987:

 

Comunicação de ordem administrativa. Audiência Pública

Assuntos: Poderes públicos e educação / Ensino básico / Educação de adultos / Ensino superior / Valorização do docente de ensino superior / Inteiração da educação física na educação / Administração da educação / Deterioração do ensino público

Expositores: Elba Siqueira de Sá Barreto, Jarbas Novelino Barato, Newton Lima Neto, Miriam Limoeiro Cardoso, Cláudio Boschi, Maria Beatriz Moreira Luce e Luiz Antônio Cunha.

Segue link para o programa integral.

Fazer Bem Feito: registro simpático

novembro 4, 2016

Fazer bem feitoAcabo de ver na internet registro muito simpático sobre meu livro Fazer Bem Feito, publicado pela UNESCO em 2015. Para ler a matéria, clique aqui.

Onde está a verdade?

novembro 2, 2016

 

Há um belo desenho animado produzido pelo National Film Board of Canada que eu usava muito em minhas aulas de filosofia para começar uma conversa sobre conhecimento. Procurei versão do mesmo no Youtube. Não encontrei. E não consegui trazer para cá a versão que pode ser encontrada no site do NFBC. Por isso faço indicação de link onde interessados poderão ver o filme. para tanto, cliquem aqui.

Depois que os alunos viam “E”, eu lhes dava um exercício para que comentassem que aspectos do filem poderiam ser considerados tendo em vista a ideia de verdade. E no final eu distribuía minha versão que é a que segue.

Conhecimento e Realidade
Reflexões sobre É

Jarbas N Barato
Usjt/2004

O filme É apresenta uma idéia de senso comum: o grande É colocado no parque é reproduzido por pequenos és na cabeça das pessoas. Aparentemente não se usa o conhecimento já existente para interpretar a nova informação. Ou seja, a idéia de conhecimento presente no filme é a de que o nosso saber é resultado de cópias mentais daquilo que nossos sentidos percebem. Esse modo de ver o conhecimento é chamado de “teoria da página em branco”. O que isso quer dizer? Muita gente entende o conhecimento como conteúdo que pode ser impresso na mente (página em branco) das pessoas. O grande educador brasileiro, Paulo Freire, costumava dizer que esse modo de ver o conhecimento produzia uma “educação bancária” . Ou seja, uma educação que entende que a missão da escola é a de depositar o saber pré-existente na cabeça (vazia) dos alunos.

O filme tem outros detalhes sobre os quais vale a pena refletir. Quase todo mundo vê a imagem da nova estátua e a lê como é. Há, porém, um senhor que lê o É de modo diferente. E mesmo com toda a insistência dos outros leitores, ele não consegue ver aquela figura como um E. Mas um cientista encontra a solução: um par de óculos. Com a visão corrigida, o tal cidadão passa a ver o mundo como os demais. Onde estava o problema? Numa visão incorreta? Se for isso, podemos nos perguntar se a tarefa da educação é a de corrigir visões incorretas. Os óculos, no caso, representariam, um novo modo de ver o mundo. Com eles, uma pessoa, antes ignorante, teria os olhos abertos para a “realidade”. Mas ainda ficam perguntas: como calcular a graduação correta da lente para que o ignorante possa ver o novo conhecimento sem erro ou desvio? Ou, sendo bastante radical, quem tem a visão correta nesta história?

Tudo parecia resolvido em É até aparecer o rei. Ele não vê um é na estátua, vê um b. Consternação geral. Todo mundo quer ajudar. O povo insiste. O cientista mostra o caminho, oferecendo os óculos para Sua Majestade. Fica a sensação de que o problema foi resolvido: o rei está vendo o é. Mas, não. O rei continua com sua primeira opinião, apesar de todas as informações que o povo lhe deu e dos óculos que lhe foram fornecidos. E para complicar as coisas, o monarca quebra os óculos. Essa atitude sinaliza a proibição de uma visão diferente ou corrigida. Fica proibido o uso de óculos. Ou seja, fica proibida a visão discordante do pensamento real.Começa a imperar um conhecimento imposto.

A maneira de impor certo modo de ver em É é interessante. Os guardas chamados pela segurança do monarca mudam na pancada as representações que as pessoas tinham em suas cabeças. Isso mostra que não basta impor um modo de pensar, é preciso mudar nos agentes de conhecimento modos de ver o mundo. É claro que um “papagaio” sempre pode falsificar as coisas.

Destes comentários é possível estabelecer algumas conclusões:

O conhecimento, ao contrário da idéia da mente como uma folha em branco, é constituído pela nossa percepção do mundo interpretada a partir de nossos saberes anteriores.
Apesar das diferenças entre as pessoas, há uma boa chance de que elaboremos representações bastante parecidas de um mesmo objeto.

Vez ou outra aparecem visões diferentes. Elas podem ser “corrigidas” para que seus autores passem a ver como a maioria. Isso implica grande mudança e necessidade de algo para auxiliar as pessoas a terem novas visões.

Mudanças profundas de visão exigem transformações significativas no nível das representações mentais.

Ficam algumas perguntas:

É fácil ou difícil obter mudanças profundas nos modos de ver o mundo?

Temos o direito de operar tais mudanças?

A educação muda modos de ver o mundo?

Escola Nova X Educação Tradicional

novembro 1, 2016

Em 2006, uma das minhas alunas da pedagogia publicou post no qual fazia um resumo da história da educação no Brasil. O texto tinha muitos equívocos. Resolvi fazer um comentário,tentando apontar aspectos problemáticos do texto que ela escrevera e publicara. Os comentários que fiz ainda são válidos. Por isso decidi trazê-los aqui para o Boteco.

Cara Aluna,

Ótimo o seu blog.  Siga em frente. Se você conseguir mantê-lo durante todo o curso, poderá construir um magnífico registro de aprendizagem. Acho que, de alguma forma, sou um pouquinho responsável por essa aventura. Não deixe, portanto, de me cobrar participação, palpites colaboração.

Em seu post anterior há alguns registros sobre movimentos educacionais que merecem alguns reparos. Você fez um resumo de um resumo e, talvez por isso, perdeu alguma substância. Como o espaço aqui é pequeno, farei observações telegráficas:

  1. Educação Tradicional. Não foi ‘fundada pelos jesuítas’ em 1549. A data marca o início de oferta de educação sistemática em colégios jesuítas no Brasil. Cabe ressaltar que, em sua época, os jesuítas propõem uma educação que tem muitos aspectos inovadores. No caso brasileiro, há inovações interessantes no uso de música e teatro na educação dos indígenas. É claro que há aspectos ideológicos que devem ser considerados, mas precisamos entendê-los no tempo. Outra coisa, o rótulo ‘Educação tradicional’ é aplicado a uma gama muito grande de movimentos educacionais. Mas é preciso reparar que há diferenças notáveis entre as diversas educações abrangidas por tal rótulo.
  2. A Escola Nova não começa em 1932. A data marca a publicação de um documento importante, o Manifesto dos Pioneiros. A Escola Nova é um movimento cujas raízes remontam às últimas décadas do século XIX. Chegou mais tarde ao Brasil, mas de qualquer forma apareceu por aqui bem antes do Manifesto de 32. O ideais da Escola Nova são hoje predominantes. O que não quer dizer que sejam corretos. Nem que sejam necessariamente melhores do que alguns aspectos da Educação Tradicional. A história não é uma narrativa que separa mocinhos (Escola Nova) e bandidos (Educação Tradicional). É algo com mais nuances, detalhes, caminhos alternativos, matizes (muitas e muitas cores, em vez de apenas preto e branco…). Algumas das convicções escolanovistas são bastante contestáveis..
  3. Sua explicação sobre Escola Tecnicista também é problemática. Certamente o tecnicismo não tem com ponto de partida o ano de 1964. Esse é ano em que começa a ditadura no Brasil… O tecnicismo tem seus começos em data mais distante e não é um movimento de contornos tão nítidos como alguns livros didáticos sugerem. Nem é também um movimento do qual resultam ensino individualizado, recursos audiovisuais etc. Cada uma dessas coisas tem uma história um pouquinho mais complicada (os audiovisuais, por exemplo, têm a ver com coisas como a invenção da fotografia, do cinema, do rádio, do disco, da possibilidade de reprodução massiva das imagens etc.). Os laboratórios de audiovisuais existiram bem antes da ideologia tecnicista (cabe lembrar que certa ‘ciência da educação’ – marcada por estudos da psicologia da aprendizagem por volta dos anos 10 e 20 do século passado – foi muito utilizada tanto por escolanovistas como por tecnologistas).
  4. Finalmente, cabe observar que as tendências críticas na educação brasileira não têm como data fundante o ano de 1983 ou o fim da ditadura. Movimentos de educação crítica são marcantes nos inícios dos anos 60, às vésperas do golpe militar. A pedagogia de Paulo Freire começa em tal época. Ao lado dela, outros movimentos notáveis apareceram em nossa terra. Um deles é a história belíssima de educação popular construída no município de Natal, RN, com o prefeito Djalma Maranhão, cujo secretário de educação., Moacir de Góes, escreveu uma memória imperdível sobre a experiência: o livro “De Pé No Chão também se aprende a ler e escrever”.

Como você pode ver, não convém usar rótulos muito definitivos para designar fases ou movimentos históricos. Tais movimentos existem, são marcas ideológicas importantes, mas é preciso entendê-los em seu desenrolar no tempo. No geral eles não têm uma data fundante. Começam devagar, em várias partes, e vão ganhando contornos definitivos no tempo. Outras vezes sequer são movimentos. São mais rótulos dados por alguém que tenta simplificar a história. A meu ver é isso que acontece com o título “Educação Tradicional”. Historicamente não há tal movimento. A “Educação Tradicional” é muito mais uma invenção de escolanovistas que queriam desacreditar a educação clássica, sobretudo nos Estados Unidos. E Educação Clássica não é necessariamente ‘tradicional’.

Fiz as observações aqui registradas com uma intenção: chamar a sua atenção para um trato mais equilibrado da história. Louvo sua disposição em traçar amplos panoramas sobre a educação em nossa terra. Continue com tal interesse. Acho que muitos educadores não têm esse gosto (o que é uma pena). Em parte isso é culpa da Escola Nova, um movimento que colocou os estudos históricos num plano secundário. Mais sobre o assunto, se lhe interessar, pode ser objeto de conversa nossa em outra ocasião.

Continue o ótimo trabalho. Grande abraço,

 

Jarbas Novelino Barato